domingo, 3 de outubro de 2021

Couro Cru & Carne Viva

  


                                BraZílica Pereira

 

neste país de fogo & palha
se falta lenha na fornalha
uma mordaz língua não falha
cospe grosso na panela
da imperial tropicanalha

não metam nestes planos
verdes/amarelos
meus dentes vãos/armados
nem foices nem martelos
meus dentes encarnados
alvos brancos belos
já estão desenganados
desta sopa de farelos


PESSOA

 

não tenho pretensões

de ser moderno

nem escrevo poesia

pensando em ser eterno.

 

veja na minha língua

as labaredas do inferno

e só use o meu poema

com a força de quem xinga.

 

GENITAL

 

pasto no cosmo

a soja secular de Jardinópolis

onde os discos-voadores

sobrevoam meu nariz

na cara das metrópoles.

 

no centro ao sul

os cemitérios

possuem mais mistérios

que a nossa vã filosofia.

 

tem um animal de vagina espacial

na poesia

&

e um grande pênis roxo

milenar

feito espiral em círculo

preparando imenso orgasmo

pra festejar o fim do século. 


TROPICALIRISMO

 

GIRAssóis pousando

Nu – teu corpo: festa

beija-flor seresta

poesia fosse

 

esse sol que emana

no teu fogo farto

lambuzando a uva

de saliva doce.


LENÇÓIS DE RENDA

 

poderia abrir teu corpo

com os meus dentes

rasgar panos e sedas

 

com as unhas

arreganhar as tuas fendas

desatar todos os nós

 

da tua cama arrancar os cobertores

rasgando as rendas dos lençóis

 

perpetuar a ferro e fogo

minhas marcas no teu útero

meus desejos imorais

 

maldizendo a hora soberana

com a força sobre humana dos mortais

quando vens me oferecer migalha e fruto

como quem dá de comer aos animais


ALUCINAÇÕES (IN)TERPOÉTICAS

 

O QUE é que mora em tua boca bia? um deus. um anjo. ou muitos dentes claros como os olhos do diabo e uma estrela como guia?

O QUE é que arde em tua boca bia? azeite sal pimenta e alho résteas de cebola um cheiro azedo de cozinha tua boca é como a minha?

 

O QUE é que pulsa em tua boca bia? mar de eternas ondas que covardes não navegam, rios de águas sujas onde os peixes se apagam.

ou um fogo cada vez mais Dante como este em minha boca de poeta delirante  nesta noite cada vez mais dia em que acendo os meus infernos em tua boca bia?

    

LUNÁTICA

 

um gato noturno

atira pedras nas estrelas

palavras e mais palavras

na carne da princesa.

 

onde o papel não bate

onde o pincel não toca.

 

o gato noturno lambe a barriga

bem perto da virilha

e trepa

no muro mais próximo

tentando alcançar o outro lado da lua

em seu instante letal

de desespero       e                       solidão. 

 

                                    FROYDIANA

 

azul são os teus olhos

a cor dos pelos não conheço

teus seios ainda não toquei

 

Dracena – é uma terra roxa

nave extra terrena

que humanos não decifraram

pequena vagina virgem

onde os dedos ainda não entraram

 

e os cachos de uvas

apodrecem nos teus dentes

com um cheiro de leite ardente

esguichando na distância


                                 pátria a(r)mada

 

só me queira assim caçado

mestiço vadio latino

leão feroz cão danado

perturbando o seu destino

 

e só me queira encapetado

profanando aqueles hinos

malandro moleque safado

depravando os seus meninos

 

só me queira enfeitiçado

veloz macio felino

em pelo nu depravado

em sua cama sol à pino

 

e só me queira desalmado

cão algoz e assassino

duplamente descarado

quando escrevo e não assino


 

alguma poesia 


não bastaria a poesia deste bonde

que despenca lua nos meus cílios
num trapézio de pingentes onde a lapa
carregada de pivetes nos seus arcos
ferindo a fria noite como um tapa
vai fazendo amor por entre os trilhos.

 

não bastaria a poesia cristalina
se rasgando o corpo estão muitas meninas
tentando a sorte em cada porta de metrô
e nós poetas desvendando palavrinhas
vamos dançando uma vertigem
no tal circo voador.

 

não bastaria todo riso pelas praças
nem o amor que os pombos tecem pelos milhos
com os pardais despedaçando nas vidraças
e as mulheres cuidando dos seus filhos.

 

 não bastaria delirar Copacabana

e esta coisa de sal que não me engana
a lua na carne navalhando um charme gay
e um cheiro de fêmea no ar devorador

aparentando realismo hipermoderno
num corpo de anjo

que não foi meu deus quem fez

esse gosto de coisa do inferno
como provar do amor no posto seis
numa cósmica e profana poesia
entre as pedras e o mar do Arpoador
mistura de feitiço e fantasia
em altas ondas de mistérios que são vossos

 

 não bastaria toda poesia

que eu trago em minha alma um tanto porca,

este postal com uma imagem meio Lorca:
um bondinho aterrissando lá na Urca
e esta cidade deitando água
em meus destroços

pois se o cristo redentor  deixasse a pedra
na certa nunca mais rezaria padre-nossos
e  na certa só faria poesia com os meus ossos.

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