quarta-feira, 27 de agosto de 2025

múltiplas poéticas

                  Tecidos sobre a Terra

 

Terra,

antes que alguém morra

escrevo prevendo a morte

arriscando a vida

antes que seja tarde

e que a língua

da minha boca

não cubra mais tua ferida

 

entre aberto

em teus ofícios

é que meu peito de poeta

sangra ao corte das navalhas

e minha veia mais aberta

é mais um rio que se espalha

 

amada de muitos sonhos

e pouco sexo

deposito a minha boca no teu cio

e uma semente fértil

nos teus seios como um rio

 

o que me dói é ver-te

devorada por estranhos olhos

e deter impulsos por fidelidade

 

ó terra incestuosa

de prazer e gestos

não me prendo ao laço

dos teus comandantes

só me enterro à fundo

nos teus vagabundos

com um prazer de fera

e um punhal diamante

 

minha terra

é de senzalas tantas

enterra em ti

milhões de outras esperanças

soterra em teus grilhões

a voz que tenta – avança

plantada em ti

como canavial que a foice corta

 

mas cravado em ti

me ponho a luta

mesmo sabendo – o vão

estreito em cada porta

 

             MOENDA

 

usina

mói a cana

o caldo e o bagaço

 

usina

mói o braço

a carne o osso

 

usina

mói o sangue

a fruta e o caroço

 

tritura suga torce

dos pés até o pescoço

 

e do alto da casa grande

os donos do engenho controlam

:

o saldo e o lucro

 

                       Artur Gomes

poema dos livros: Suor & Cio

MVPB Edições - 1985

e Pátria A(r)mada

Editora Desconcertos – 2019

Prêmio Oswald de Andrade – UBE-Rio-2020 – lançamendo da segunda edição ampliada em 2022

gravado no CD Fulinaíma Sax Blues Poesia

2002

 

                        PoÉticas ArturiAnas

www.arturkabrunco.blogspot.com

 



desconfiguração do corpo

 

os estilhaços do corpo

estão espalhados

nas cidades

:

pernas aqui

braços ali

cabeças acolá

na total desconfiguração

:

- cabeça/tronco/membros

as cidades estão entupidas

de fragmentos de populações

destroçadas em desespero

a crueldade é tanta

que dificilmente em qualquer cidade

se encontra um ser humano por inteiro

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

Editora Penalux - 2020

www.secretasjuras.blogspot.com 

         metaforicamente

 

passarás

não verás

país nenhum

             nunca

tua carne desossada

nonada tão real

visceralmente explícita

onde tudo vale nada

desconhecido

 

eu quero ser

visto apenas

por entidades ocultas

           olhos invisíveis

pedras

peixes

plumas

pássaros

           as meninas do Leblon

 

as meninas do leblon

não sobem no vidigal

pensam que as pedras

lá de cima

cheiram mais que o anormal

 

mas a flor de lótus

           flor de cactos

           flor delírios

cheiram muito mais

            que as pedras

que elas não querem cheirar

no vidigal

 

                      Artur Gomes

O homem com a flor na boca

www.arturfulinaima.blogspot.com

com os dentes

cravados na memória

para Paulo Ciranda

 

em Itacoatiara o mar  me beijou a boca 

na praia no verão de dois mil e dezessete

sinto o gosto agora

como se Itaipu fosse Pedra Dourada

com um beijo de São Paulo

Itapetininga ou mesmo uma  Itaocara

onde estivemos  em mil novecentos

 e setenta e seis numa Balada Pros Mortais

que em mil novecentos e setenta e sete 

 transbordou Ave da Paz

primeira da nossa safra

com registro fonográfico

gravada por Biafra

depois em Miracema mil novecentos e oitenta e um

 dançamos com um Boi Pintadinho

nossa canção ao vento Fotografia Urbana

mais uma vez Itaocara mais  um Festival dos Festivais

em mil novecentos e oitenta e dois 

e a ciranda gira nessa roda gigante

que vai bordando sonoridades no tempo

 

Artur Gomes

PoÉticas ArturiAnas

https://www.facebook.com/arturgomespoeta

manguinhos

poema em linha torta

 

geograficamente

lapa para mim são 3

em campos no rio e em sampa

em mil novecentos e noventa em seis

quando publiquei sampleando

pela primeira vez

uma ninfeta paulista

me perguntou onde era

a lapa do poema

de manguinhos lhe respondi

:

o poema pode ser um beijo em tua boca

 

há tempos não tenho paciência

para respostas concretas

se no poema o poeta faz referências

a estação da luz av. paulista

consolação água branca barra funda

essa lapa só pode ser em sampa

né cara pálida ninfeta analfabeta


 Federico Baudelaire

https://www.facebook.com/federicoduboi


27 de agosto
com muito gosto
fazer setenta e sete
outra coisa me disse
fulinaíma
pra definir o que faço
o traço a cada compasso
pensado sentido vivido
estando inteiro
não par/ti/do
a língua ainda
entre/dentes
a faca
ainda mais afiada
a carNAvalha in/decente
escre/v(l)er
é tudo o que posso
pra desafinar os contentes
desempatar de/repente
o jogo dos reles bandidos
é tudo o que tenho feito
por mais que tenha sofrido
nas unhas dos dedos
nos nervos
na carnadura dos ossos

Artur Gomes

Hoje Balbúrdia PoÉtica especial
no Carioca Bar - Rua Francisca Carvalho de Azevedo, 17
Parque São Caetano - Campos dos Goytacazes-RJ
Espero vocês lá, a partir das 18h

leia mais no blog
Artur Fulinaimagens
https://fulinaimargens.blogspot.com/


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